E o que é um “verdadeiro louco”?
É um homem que preferiu ficar louco, no sentido socialmente aceite (que nunca é o sentido real e vivo, instrínseco das coisas), em vez de trair uma determinada ideia superior de honra humana.
Assim, a sociedade manda estrangular nos seus manicómios todos aqueles dos quais quer desembaraçar-se ou defender-se porque se recusam a ser seus cúmplices em certas enormidades.
Pois o louco é o homem que a sociedade não quer ouvir e que é impedido de enunciar certas verdades intoleráveis.
Neste caso, a reclusão não é sua única arma e a conspiração social tem outros meios para triunfar sobre as vontades que deseja esmagar.
Há grandes sessões de enfeitiçamento global das quais participa, periodicamente, a consciência em pânico.
Assim por ocasião de uma guerra, de uma revolução, de um transtorno social ainda latente, a consciência colectiva é interrogada e questiona-se para emitir um julgamento. (No circular teatro-fantasma onde a vida é apenas simulada e não vivida, onde o homem se torna mais máquina do que as próprias máquinas criadas por ele próprio).
Essa consciência também pode ser provocada e despertada por certos casos individuais particularmente flagrantes.
Assim foi que houve feitiços colectivos nos casos de Baudelaire, Edgar Poe, Gérard de Nerval, Nietzsche, Kierkgaard, Fraz Kanfka, Gregório Delgado, e também Vang Gogh.
É assim que poucas pessoas lúcidas e de boa vontade que se debatem sobre a terra já se viram tragadas pela profundeza de autênticos pesadelos em vigília e rodeadas por uma poderosa sucção, pela poderosa opressão tentacular (nazi) de um tipo de magia cívica e psíquica, que já se vê a aparecer nos costumes de modo manifesto.
Diante dessa sordidez unânime que de um lado se baseia no sexo e de outra nos ritos psíquicos, não há delírio em passear à noite com um chapéu coroado por doze velas para pintar uma paisagem natural; pois como faria o pobre Van Gogh para iluminar-se, e pintar suas paisagens, em pleno século XIX?
Antonin ARTAUD, Van Gogh, O suicidado da sociedade
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