sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Lena

A Lena foi uma das minhas três avós emprestadas. Foi-se primeiro a Joana, depois a Gabriela, agora a Lena. As três eram professoras. Aprendi muito com elas e não fui aluna de nenhuma. 

Não convivi muito com a Lena nestes últimos tempos, mas a Lena anda comigo na vida, no meu dia-a-dia, julgo que para sempre. Aprendi tantas coisas com ela que estou sempre a valer-me dessas aprendizagens. Formam o meu pensamento, formam os meus gestos. 

Aprendi, por exemplo: 

- que as plantas no Inverno têm água e estão bem, mas, no Verão, «estão em sofrimento» - por isso não se deve fazer podas no Verão; 

- que as ondinhas esbranquiçadas que às vezes aparecem na t-shirt são os sais deixados pela transpiração; 

- que não é no dia 24 de Dezembro que se deve dar prendas mas sim em 6 de Janeiro, que foi quando chegaram os reis magos; 

- que há pessoas que nasceram num dia (por exemplo no dia 3 de Agosto), mas foram registadas noutro (por exemplo no dia 4 de Agosto), e que os BIs podem dizer mentiras;

- que uma pessoa que eu sempre vira de cabelo curto podia já ter tido tranças; 

- que se pode ter os olhos cinzentos, e que se pode formar um círculo à volta da íris dos olhos, e que esses olhos podem ver objectos voadores não identificados; 

- que se pode ser uma mulher independente com 50, 60, 70 anos e, para além de fumar com gosto e beber whisky, admitir o enorme prazer que dá rebentar as bolinhas do plástico-bolha; 

- que ter avós emprestadas é alargar mundos; 

- que se pode dizer que não quando não nos apetece, só porque não nos apetece; 

- que se pode tentar calar a dor assobiando, sorrindo e cantarolando palavras estrangeiras.

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