sexta-feira, 18 de janeiro de 2013
A nova escola da Fontinha - Rio gasta 200 mil euros a tentar lavar a cara e mostra mais uma vez que é uma besta
O presidente da Câmara do Porto visitou esta sexta-feira o novo Centro de Recursos Sociais da cidade, um investimento autárquico de "200 mil euros" na antiga escola da Fontinha, ocupada pelo movimento Es.Col.A até ao despejo camarário de abril.
"Este é o projeto social que estava na nossa mente desde sempre. É um edifício que acolhe diversas instituições de caráter social, da sociedade e da autarquia", descreveu Rui Rio, no fim de uma visita ao novo equipamento.
No espaço estão agora várias instituições ligadas ao apoio a mulheres, ao endividamento, a crianças autistas, ao combate à SIDA, e à inserção profissional, para começar a funcionar "em pleno" a partir de 1 de fevereiro, adiantou o autarca.
A 19 de abril, a Câmara do Porto despejou da antiga escola primária da Fontinha os ocupantes do movimento Es.Col.A, numa ação que provocou confrontos com a polícia e levou três pessoas a tribunal.
"O que estava pensado para aqui foi sempre isto. Acho que isto é adequado. É uma boa ideia, é útil para a sociedade. Espero que, nas suas mais diversas vertentes, possa apoiar devidamente a população", frisou.
As obras custaram à autarquia "200 mil euros" e demoraram "pelo menos" mais "um mês" do que o previsto porque o espaço foi várias vezes "vandalizado", lamentou o autarca, em declarações aos jornalistas.
"Houve um atraso porque isto foi permanentemente vandalizado e roubado. É lamentável e mostra que os movimentos em torno disto não eram os melhores. Acho que ninguém ganhou nada com isso. Nenhum portuense ganhou com isso, mas enfim, são mentalidades", frisou.
Rio disse que a passagem pelo local não foi "bem uma inauguração" mas "uma visita às instalações que ficaram prontas há 15 dias ou três semanas".
"O que manda o bom senso é não fazer grandes anúncios que deem para grandes espetáculos. Manda a prudência que o fizesse de forma discreta para não provocar as pessoas, se é que elas se achariam provocadas", esclareceu.
O edil admitiu ter feito a visita "com mais discrição do que o que costume" para "evitar espetáculos degradantes, eventualmente".
A presença da polícia foi também justificada por razões "de elementar bom senso".
Já depois de Rio ter abandonado o local, alguns populares tentaram pacificamente entrar nas instalações mas foram impedidos pela polícia de o fazer.
A APAV - Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, a Associação Portuguesa para a Reeducação em Matéria de Endividamento, a Associação de Defesa dos Interesses e da Igualdade das Mulheres e o Instituto de Emprego e Formação Profissional são algumas das entidades presentes no novo equipamento.
As instituições têm a cargo "uma renda simbólica" e todos os ocupantes, incluindo as entidades ligadas à autarquia pagam condomínio, esclareceu o edil.
O despejo de abril de 2012 foi justificado pela autarquia com a recusa do Es.Col.A em formalizar um contrato de cedência e o pagamento de uma renda simbólica de 30 euros.
Durante as celebrações populares do 25 de abril de 1974, milhares de pessoas juntaram-se aos elementos do movimento para reocupar a escola, onde o Es.Col.A se tinha instalado em abril de 2011.
Em maio a autarquia despejou os ocupantes, mas a contestação popular levou a Câmara a "ceder" a escola até ao fim de dezembro de 2011.
[Tirado do Jornal de Notícias]
sexta-feira, 11 de janeiro de 2013
Só te digo Apollinaire
Só te digo apollinaire
Só te digo em voo em dias
de vertigem certa
Hoje por exemplo abri a pestana apollinaire
como quem abre champanhe triste.
Só te digo. Digo-te apollinaire.
Abri a pestana e era
a era triste de dizer isto
é velho tudo e eu farto.
Sempre soube que isto da tristeza se pega
como mitológica doença venérea
depois de muita leitura na cama.
Vou pelos ares do meio do século.
Fugir logo de manhã do quarto alugado
meter pelas ruas à procura de rampas
que são os miradouros mais modernos.
Fugir logo de manhã e saber
que há boticários para quase tudo
há prospectos de venenos a vapor
agora menos ruidosos mais de bolso
Há passeios organizados entre as colunas
de óbitos e há seguramente poesia nisso
e em passar pelo suspiro ronco das sirenes
e ficar à conversa em surdina.
Sirenes sirenes
as minhas as matutinas
e as outras
mas hoje a mim nada me canta.
Nada de ascensores dos que engendram
rosas ruidosas para oferecer aos passantes
e dizer olhem-me para estas belas sirenes.
Já cansa as coisas serem por todo o lado.
Olha uma rampa.
É apanhar o jeito e deixar o solo.
É a cair que faço a minha melhor imitação de alarme.
É fácil
como a desgraça o autoclismo
ou meter as mãos à garganta para soluçar
é barato como andar para trás escorregar
beleza abaixo na minha trotineta
é perigoso como andar
por aí a ganhar tempo
e apanhar um bocado de ar
mesmo no meio da testa
e daí o cabelo assim para trás
que é moderno
em suma é fácil
como não encontrar o caminho para casa
depois de um século às voltas e no fundo
faz-me mal ler-te porra Apollinaire
Não estás vivo
e eu estou farto disto lá isso
e hoje os automóveis não se parecem com nada
ah em suma isso era dantes
e depois dizer adeus
é difícil como fazer pela vida
em voo mesmo quando se apanha
um daqueles miradouros jeitosos
num bairro dos mais finos.
A verdade é que não há miradouros jeitosos
ou eu já não sei ganhar balanço.
É que no fundo a poesia disto é poucochinha.
Eu tentei apollinaire
só te digo apollinaire
era voltares e ias ver.
eu gostaria de não ter de te dizer
mas é
em suma isto
e vá há de vez
em quando
uma rampa aqui e ali de jeito
no fim de um verso
por isso volto ao quarto e digo-te apollinaire
a ver se apanho a tristeza quando ela fôr a subir.
Miguel Cardoso
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