ansiedade, anemia...
ando a jogar ao stop.
a silhueta da menina pires é uma sombra e uma mão
Nasceu em 1908. Achava que o
teatro devia ser outra coisa: “capaz de falar à inteligência e à
sensibilidade, capaz de ajudar-nos a compreender a meada enredada que é a
vida, capaz de colocar-nos em frente dos múltiplos problemas coletivos e
individuais das humanas criaturas, obrigando-nos a pensar neles e a por
nós próprios lhes buscarmos soluções.” Suicidou-se em 1950. Ficou
conhecida por ser declamadora. Ficou conhecida? Não. De facto, já
ninguém a conhece. Mas ainda dá o nome a algumas ruas. E ao foyer deste
teatro, porque foi assim que o Teatro da Cornucópia lhe resolveu chamar.
Mas afinal quem foi esta atriz, escritora, jornalista e ativista
feminista e antifascista? E como foi sendo habitada a Sala Manuela
Porto?
Neste episódio do Dito e Feito, a investigadora em estudos de teatro
Diana Dionísio constrói um retrato que também desenreda várias camadas
da vida cultural de uma cidade.
guião e montagem
Diana Dionísio
locução
Diana Dionísio e Toni
edição sonora do Dito e Feito
Pedro Macedo / Framed Films
música original do Dito e Feito
Raw Forest
produção
Teatro do Bairro Alto
2023
Uma laranja azul
Uma castanha verde
Uma rosa amarela
Uma negra roxa
Uma branca prateada
Uma prata branqueada
Ah, insanidade, vem com a idade
cabecinha sem tempero
faz chorar de riso com pouco siso
um riso tão desespero
Ah, porque você é louco assim?
assim, tão desandado
ah, cabeça minha, quem é do contra
não conhece sanidade
Vai, meu coração, esquece a razão
usa só loucuridade
quem semeia vento, diz a paixão
colhe belas tempestades
Pão, meu coração
larga miolo, miolo esfarelado
Vai, porque quem guarda o miolo
nunca é desmiolado
Trovoada.
As pessoas fazem perguntas estranhas: tens mais medo do trovão ou do relâmpago?
E agora reparo
O relâmpago faz-me fechar os olhos, baixar a cabeça, querer enterrar-me, começo a ter dificuldade de respirar, começo a arfar.
No trovão fecho mais os olhos, recolho os ombros, junto o queixo ao peito, tremo, peço desculpa por todos os males que fiz. Os trovões demoram.
Na absoluta fragilidade.
Uma trovoada mesmo em cima e eu fechada dentro de dois metros quadrados com um inimigo.
Os pneus são de borracha - dizem-me as pessoas que me fazem perguntas estranhas.
O que é que isso interessa?
que me deixassem prolongá-lo
que as paredes do corpo agarrassem aquela sensação cá dentro
os caminhos: a arte com palavras e cores
as dores: a corrida cinzenta
sem conversa, dança ou amores
ideias: soltas loucas mas
irmãs da persistência
(isto ontem)
o mais bonito de tudo são os teus olhos, gato
a preverem a parede a cair
que o vizinho mina
salpicam-te as costas as cãs
lembra-me a rima as rãs
escoo tudo por um gargalo
a receita pede minutos
as dores reais mais páginas
mas que mais dos ais?
imagens?
faltava o açucarado húmido
das flores laranja dos jardins dos açores
ou algum pedaço de moléculas de ar da serra da estrela
) o som da televisão entupia tudo, enchia, ocupava à força,
opiava (
faltava uma residência literária termal de quinze dias
antes de ligar a rádio
terei voltado? assim mesmo sem volts?
depois de ligar a rádio
pensar depois depois não agora
sempre pra depois tudo pensar depois e depois
nunca
e a propósito daquilo:
eu não sou eu nem sou o outro
nada é, tudo se transforma a todo o momento
blá blá blá
e às vezes transformamo-nos pouco
demenos
se há demais porque não há demenos?
as estrelas todas que aprendi contigo
desaprendi-as
eu mitómana mitocôndria
os insectos fora dos alfinetes
um lenço roxo o SG lights as pedras
planetas de pirite falsos cubos nebulosas
ainda há cá clorofila
e faltam estrelas d’acampar
matraca que não respira nem deixa respirar
insuportável
ser de costas doridas, ancas gordurosas, coração em ácido
olhos a esforçar a superfície
não ter um meu planeta aqui, bolinha de bruxa
pra montar e fugir de tudo para sempre finalmente
matar a cabeça
matá-la
sair com alívio de dentro de mim
isto não ter fim
ser só sempre pesadelo de pedra de sísifo
desde que nascemos que imitamos
imitamos os outros e depois começamos
a imitar-nos a nós próprios
quanto mais andamos mais andamos
quanto menos andamos menos andamos
quanto mais fazemos mais fazemos
quanto menos fazemos menos fazemos
quanto mais comemos mais comemos
quanto menos comemos menos comemos
quanto mais
Ouve na RÁDIO PARALELO
ou no dia seguinte, na PÁGINA DA CASA DA ACHADA
A Rádio Gabriela está a publicar alguns programas de DJionísio no seu blog!
VER AQUI.
DJionísio faz programas para serem ouvidos. A maior parte são colagens de músicas, textos e outras divagações sobre um mesmo tema ou com pretextos variados. Alguns são para ouvir sentado, deitado ou pendurado pelos pés, outros são para dançar. Aqui se publica, especialmente a pensar nes ouvintes da Rádio Gabriela, uma escolha de alguns desses programas, já todos emitidos ao vivo em sessões diversas e/ou na Rádio Paralelo, e vários deles escutados nas sessões «Ouvido de Tísico» feitas mensalmente na Casa da Achada – Centro Mário Dionísio.
OUVIDO DE TÍSICO Nº 13
CANÇÕES POR UM CAMINHO DE PALAVRAS
As palavras puxam palavras e fazem um caminho de palavras. Cada palavra puxa uma canção e fazem um caminho de canções. Vamos ouvir esse caminho. Podem trazer pedrinhas: de pão, de chocolate, de cenoura, de queijo… a ver se a prima Vera chega e se nos deixa apanhar o sol e a sombra do quintal.
Nas sessões «Ouvido de Tísico» a proposta é escutar. Fácil? Difícil? Num mundo que nos quer entupir os ouvidos, nós queremos continuar a fazer cócegas ao caracol. Ouvir-se-ão textos de vários autores, saladas musicais, documentos desencantados do Centro de Documentação da Casa da Achada, discos do princípio ao fim, entrevistas, enfim, de tudo um pouco. Pode-se ouvir de pé ou sentado, sentado ou deitado. Pode ouvir-se de olhos fechados ou abertos, abertos ou semicerrados. Pode-se desenhar enquanto se ouve, ou escrever, ou não fazer mais do que… ouvir.
No sábado 21 de Março às 15h30, mais uma sessão de escuta da rubrica «Ouvido de Tísico» prometia dar as boas vindas à Primavera com convívio no quintal da Casa da Achada. Dadas as circunstâncias virais, a sessão nº 13 do Ouvido de Tísico – «canções por um caminho de palavras» – foi publicada online, para convivermos perto ao longe.